BRASÍLIA - Em meio à queda de braço entre o governo federal e os governadores em torno da desoneração do ICMS, o possível rebaixamento da nota de crédito pelo Tesouro Nacional dos Estados que venham a pedir compensação pela perda de arrecadação no Supremo Tribunal Federal (STF) poderia fazer com que até 15 governadores perdessem a garantia da União para fazer empréstimos. São Estados que hoje têm a classificação B e, se rebaixados, passariam para a C.
A nota de crédito, também chamada de Capacidade de Pagamento (Capag), funciona como uma espécie de selo de bom pagador concedido pelo Tesouro. Ela avalia a saúde financeira de um Estado e qualifica se ele pode ou não receber empréstimos com garantia da União. As notas vão de A, para os Estados em melhor situação fiscal, a D, em pior situação. Estados com notas A e B podem tomar crédito com garantia do governo federal.
Hoje, há 15 Estados com nota B, entre eles, os quatro que já obtiveram liminares no STF com a previsão de compensação da perda de arrecadação do ICMS por meio do abatimento do pagamento de parcelas da dívida com a União (Maranhão, Alagoas, Piauí e São Paulo). O rebaixamento da nota poderia, então, ser prejudicial a esses Estados, que perderiam a garantia da União e teriam maior dificuldade para tomar crédito no mercado.
O secretário da Fazenda de Alagoas, George Santoro, questiona o fato de o Tesouro justificar a possível reclassificação da nota de crédito pela declaração de dificuldades financeiras por parte dos Estados. “Em momento algum, o Estado alegou que estava em situação difícil. A gente só pediu ao Supremo para cumprir o que está na lei complementar”, diz. “É uma posição de enfrentamento aos Estados que tiveram essas decisões liminares. Parece que é uma retaliação do governo federal.”
Ele afirma que o Estado de Alagoas já consta como inadimplente no Cauc, uma plataforma do Tesouro, e foi notificado de prestação vencida e não paga em operação com o Banco do Brasil – que tem a União como garantia. “Pararam as nossas operações de crédito e, agora, tememos o bloqueio do Fundo de Participação dos Estados (FPE) no próximo dia 10, que é a contragarantia nessa operação”, diz ele. O Estado já apresentou requerimentos sobre o caso ao ministro do STF Luís Roberto Barroso.
Já o secretário da Fazenda do Piauí, Antônio Luiz Santos, questiona o entendimento do Ministério da Economia de que a compensação para as perdas dos Estados só poderia ser feita em 2023, ao comparar a perda de arrecadação do exercício de 2022 com a de 2021. “Querem que termine o ano fiscal para apurar as perdas. Seria como esperar o paciente entrar na UTI para depois agir para salvá-lo, em vez de tratar logo no começo da enfermidade”, diz.
Ele avalia que a redução do imposto sem dispositivos claros para a compensação vai comprometer o serviço público. “Os Estados estão equilibrados, porém tendem a entrar em desequilíbrio no curto prazo. Improvável que consigam prestar os mesmos serviços na educação, saúde e segurança, sem falar em outras ações sociais, se for mantida essa situação de forçarem a redução de impostos estaduais importantes, como o ICMS, sem um mecanismo de compensação”, diz Santos.
Esse movimento de contestação dos Estados junto ao Supremo se intensificou depois que representantes estaduais sinalizaram ao Tesouro que o texto da lei aprovada no Congresso Nacional abriria uma brecha legal para requerer uma compensação maior do que a que exceder os 5% de perda de arrecadação com o ICMS. Esse gatilho para acionar a compensação da União aos Estados foi aprovado com o projeto que fixou um teto entre 17% e 18% para o tributo sobre bens considerados essenciais, como combustíveis e energia elétrica.
Com base nessa interpretação, o governo teria de compensar toda a queda de receita quando a perda ultrapassar o gatilho dos 5%. Ou seja, se a receita cair 5%, a obrigação do governo seria compensar não somente o excedente, mas, sim, a totalidade das perdas.